Em 23 de dezembro de um ano qualquer,
Carta a Srta. Braga,
Apenas um tratado sobre a
Solidão.
De onde vem a solidão, e por que temos tanto
medo de estarmos sós? A solidão sempre foi ao Homem um sentimento dual. Certas horas, a desejamos com todo o afinco, a fim de sermos deixados para refletir sobre nós mesmos conosco mesmo. Em outros momentos, temos horror à idéia de estarmos sozinhos,
talvez até com medo de nos encararmos, ou apenas porque nos conhecemos bem o suficiente e sempre saberemos a resposta que daríamos a nós mesmos se estivéssemos conversando. Em outras palavras, definitivamente, o Homem tem medo de estar só.
Antes de tudo, permita-me esclarecer que não escrevo a senhorita a fim de que leia sobre meus devaneios reflexivos.
Afinal, quem perde tempo com algo inútil como a Filosofia? Escrevo apenas na esperança de que, tirando tais palavras e idéias de minha cabeça e expondo-as no papel, possa aliviar meu coração e mente das sobrecargas de uma vida sem sentido. Ser essas letras lhe é enfadonhas, sem pena as deixe de lado, mas espero de coração que possas me entender.
Nesta correspondência, escrevo-lhe para falar da solidão. Sentimento cruel, esse. Acredito que nenhum ser humano deveria sentir tal dor,
a dor de estar só. Outros pensadores diriam apenas que o Homem é um ser social, que foi incumbido por Deus a viver em uma sociedade, e por sua psique é tão afetada ao estar só. Eu, como um livre pensador, diria que o Homem não é feliz quando está só, pois tem medo de encarar a si mesmo, e Deus não tem nada com isso.
Não que eu condene isso, de modo algum! Eu tenho meus demônios também, e não são poucos, posso lhe garantir. Também sou Homem, tenho muito medo de encarar a mim mesmo e também tenho medo de estar só. E quando digo de solidão, não quero dizer apenas de estar solteiro, namorando ou casado. A solidão se refere ao fato de não ter ninguém além de si mesmo. Tenho vários amigos, mas poucos com quem posso conversar com um nível de afinidade confortável ao meu coração, e isso me deixa a beira da sanidade, uma vez que preciso de alguém para me ouvir.
Não suporto meus próprios pensamentos. Classificaria a solidão como uma doença, se a mim fosse dado tal poder. Exagero? Ora, minha cara, pense comigo. Qual mal deixa o Homem em um estado tão crítico de depressão, de modo a que não possa compartilhar de si mesmo ao próximo, se não a Solidão (e agora a trato com “S” maiúsculo)? O Homem frente a si mesmo pensa demais, não só sobre si, mais sobre o sentido da existência, sobre as coisas da vida e outros mistérios da Humanidade, que nem sábios como Aristóteles e Platão tiveram a audácia de enfrentar além de seu próprio íntimo.
Encarar a si mesmo não é tarefa fácil. Entenderia Hobbies dizendo que “o Homem é o Lobo do Homem” como o Homem sendo o Lobo de si mesmo, de seu próprio
Eu. O Homem tem uma surpreendente capacidade de destruir a si mesmo, voluntária e involuntariamente. Acho que involuntariamente é pior, pois quando se percebe, geralmente a pessoa já não é mais nem a sombra do que costumava ser. Graças a Deus, sempre há um caminho de volta; um trabalhoso caminho, mas em que se tem a chance de recomeçar.
Se penso e logo existo, preferia não pensar e
não existir. A capacidade de pensar em nossos medos e fraquezas causa muita dor em nós mesmo, assim como a idéia de não existir é extremamente confortável. Não me refiro aqui ao suicídio, mas sim a existência de um ponto de vista metafísico. Mas que Homem existe se existe vivendo só, de modo a não ser notado? Se uma árvore cai no meio de uma floresta fechada, onde nenhum ouvido possa ouvir seu ruído, sua queda faz barulho?
Em alguns dias será Natal e as famílias e amigos se reunirão. Não importa,
pois muitas vezes pode-se estar em meio a uma multidão, e ainda assim, estar só.
Mas então, o que nos classifica como uma pessoa solitária?
Não sei, e provavelmente nunca saberei.
Mas se lhe serve de consolo, eu sei que sou uma...
Ass:
Daquele que ja foi seu amado, Eduardo Costa da Silva.